quarta-feira, 30 de novembro de 2016

CUBA SEM FIDEL

    Importante figura do episcopado brasileiro, eleitor do Papa, declarou certa vez em público que Cuba era a realização do paraíso terrestre em nossos dias. Outros membros de destaque na Igreja do Brasil, sobretudo um que ocupou cargo político, no governo Lula, se bem que passageiro, é verdade, fez entusiásticas declarações políticas em favor de Cuba. Já, ao contrário, em um Congresso continental latino-americano, das Vocações sacerdotais, a que participei em Itaici, indicado por  Dom Luciano Mendes de Almeida, na época, Presidente da CNBB, havia uma religiosa de Cuba, encarregada das vocações sacerdotais na Ilha caribenha. Interrogada sobre a verdadeira situação do povo cubano, ela afirmou categoricamente: “Só fala bem da situação social e política de Cuba, quem não vive lá como cidadão comum. Os turistas e personalidades que visitam nossa Ilha, não conhecem a verdadeira, triste e miserável situação do povo cubano.” Verdade é que grande parte da miséria de Cuba se devia ao embargo econômico e alimentar, imposto pelos Estados Unidos e outras potências econômicas do mundo.
                 Fidel Castro, filho de rico fazendeiro, que possuía vastas terras, estudou com os jesuítas, a  Congregação do Papa Francisco,  juntamente com seus irmãos, Raul e os outros, em Santiago de Cuba. Dizia-se, na época, que os guerrilheiros de Sierra Maestra, combatendo a ditadura opressora de Somoza,  empunhavam o terço de Nossa Senhora, juntamente com a metralhadora. Foi esse homem que, dois anos após a vitória sobre a ditadura,  com surpresa geral, declarou que a partir dali Cuba teria o regime comunista de governo. Na verdade, era mais uma opção pela União Soviética, em plena guerra fria, contrariando o velho e arquinimigo, explorador de sua economia, o poderoso vizinho, os Estados Unidos da América.
1                 O regime imposto a Cuba foi desumano e cruel e  levou ao “paredón” de fuzilamento milhares de opositores, que não conseguiram fugir para a vizinha Flórida. A imprensa brasileira divulgou uma estimativa do Cuba Archive, que afirma que o regime castrista foi responsável pela morte de 88 mil cidadãos e destaca que 5.000 foram executados e 2.300 morreram em prisões do regime. Com salários de fome, reduziu a população pobre a um triste estado de abastecimento alimentar, vestuário e transporte. Mas tem um grande mérito: preocupou-se muito com a educação, com notáveis resultados e reduziu notavelmente a praga do analfabetismo, que tinha níveis astronômicos e hoje se acha reduzida a razoáveis índices, comuns na América Latina. Na medicina, vem formando médicos de reputação mundial. Em novembro de 1983, em Luanda, capital de Angola, na guerra civil que se seguiu à independência daquele país africano, ao qual o Brasil tanto deve e não ajudou na libertação do jugo português, pude  ver seus excelentes médicos,  trabalhando em míseros hospitais. Já agora, em tempos de paz, em outubro de 2014, fui atendido na mesma Luanda, na Clínica Atália, por excelente equipe de médicos cubanos, sob a direção da Dra. Clara Guerrero Selde.
                  Em 15 de março de 1990, na posse do Presidente Collor em Brasília, na Câmara dos Deputados, o “Comandante”  Fidel destacava-se dos demais Chefes de Estado presentes, por usar fardamento militar verde-oliva e  com a barba imponente, que lhe dava certo ar de superioridade entre as demais autoridades, todas naturalmente usando traje formal de cor preta.
                   Articulada pelo Papa Francisco, Estados Unidos e Cuba começaram com Barack Obama e Raul Castro certa abertura diplomática em dezembro de 2014, para no ano seguinte restabelecerem as relações diplomáticas, rompidas em 1961.

                    E agora, como será Cuba, sem Fidel Castro? Que Santo Antônio Maria Claret, o santo espanhol, que foi missionário em Cuba, a proteja e a Virgem da Caridade do Cobre,  celestial padroeira da Ilha caribenha de seu Santuário nacional em Santiago de Cuba, abençoe o heroico povo cubano.

segunda-feira, 21 de novembro de 2016

UM FILHO, PRESENTE DE DEUS


Visitei nesses dias um casal amigo, que me chama de “avô”. Estavam muito felizes pela chegada de seu primeiro filho. Fiquei pensando na riqueza e no sentido de receber de Deus esse grande dom:  um filho.
            Escrevi em Maceió em minha Carta Pastoral sobre a Família, a que mais me alegra e a que mais estimo: “Todos devem considerar o filho como a fortuna, a preciosidade e o tesouro de um lar. Nenhum bem material, nenhuma riqueza terrena, pode comparar-se a um filho. Um lar sem filhos é um lar vazio. É uma casa triste. É uma família incompleta. Muitas vezes é sem culpa dos esposos. Mas um casal sem filhos não deixa de ser fato desolador. O filho é a encarnação do amor do pai e da mãe. No filho, o amor se faz pessoa. Como o Cristo é a encarnação do Verbo, assim o filho que vem à vida é o amor dos dois esposos, que se faz criatura humana. O filho é a perpetuação do milagre da criação. Os pais se tornam co-criadores com Deus, que por amor criou o universo. Assim, eles por amor, associam-se à obra criadora de Deus e têm, no filho, a concretização desse amor. Todo filho repete em si a pessoa do pai e da mãe e testemunha ao mundo o amor de seus pais, que o geraram no amor e pelo amor. “
            E a seguir, cito o ensinamento da Conferência Episcopal Latino-americana de Puebla em 1979: “Cristo, ao nascer, assumiu a condição da criança: pobre e sujeita aos pais. Toda criança, imagem de Jesus que nasce, deve ser acolhida com carinho e bondade. Ao transmitir a vida a um filho, o amor conjugal produz uma pessoa, nova, singular, única e irrepetível. O rosto de Cristo transparece no rosto da criança que se deseja e se traz livremente à vida” (Puebla, n.584).
            E concluí na citada Carta Pastoral:  “Aí temos toda a maravilhosa fecundidade do amor, que gera filhos, isto é, criaturas humanas, perpetuadoras do milagre da criação e continuadoras da aventura humana sobre a Terra”.
            Nosso poeta João Cabral de Melo Neto, em seu admirável poema “Morte e vida severina”, escreve com humor: “Conversais e não sabeis que vosso filho é chegado? Estais aí conversando em vossa prosa entretida: não sabeis que vosso filho saltou para dentro da vida? Saltou para dentro da vida ao dar seu primeiro grito; e estais aí conversando; pois sabei que ele é nascido.”

            O filho do rico e o filho do pobre Severino da Maria do Zacarias são o mesmo dom de Deus, que enriquece a família, alegra a sociedade e traz em si as esperanças de um mundo melhor. 

quinta-feira, 17 de novembro de 2016

A SENADORA E O ACORDO

             Dado meu trabalho fora do continente, só nesta primeira semana de janeiro é que tive o prazer de ler o magnífico pronunciamento da Senadora por Alagoas, Ada Mello, em  28 de novembro último, no Senado Federal, a respeito do acordo, firmado em Roma a 13 de novembro entre a Santa Sé e o governo de nosso país. Confesso que muito me alegrou a clareza da posição assumida pela nossa querida Ada em defesa da constitucionalidade daquele instrumento jurídico, que será ratificado pelo Congresso Nacional e irá agora regular as relações entre Igreja e Estado em nossa pátria.
            Logo de início, nossa Senadora exorcizou a falsa idéia transmitida por algumas notas da imprensa, alusivas “à possível inconstitucionalidade da iniciativa por se tratar de um acordo entre um estado laico e uma instituição religiosa” e fez três preciosas e oportunas citações. Uma, do Ministério das Relações Exteriores, que afirmou que se trata “de documento puramente administrativo que formaliza aspectos já vigentes no dia-a-dia do País.” Outra, da Conferência dos Bispos, que esclareceu que o acordo não concede privilégios à Igreja Católica em detrimento de outras confissões religiosas e respeita integralmente a Constituição brasileira e todo o ordenamento jurídico brasileiro.
A senadora citou ainda um artigo do Ministro do Tribunal Superior do Trabalho, Ives Granda, distinguindo estado laico, que reconhece o fato religioso como componente constitutivo da sociedade humana e estado ateu, que rejeita toda manifestação religiosa, fixando-se numa concepção materialista do homem e da sociedade. “Laico” é o estado que felizmente separa Igreja de estado e reconhece a liberdade de consciência dos cidadãos  e “ateu” é o estado.que nega Deus como Senhor supremo d o universo e coíbe qualquer manifestação da fé religiosa de seus súditos.
            Santa Sé é o órgão supremo do governo da Igreja, definido no cânon 361 do Código de Direito Canônico e que representa a Igreja Católica na esfera das relações internacionais, diante dos estados e governos civis. Não se confunde nem com o estado da Cidade do Vaticano nem com a cúria romana, que é apenas uma parte dela.
            A Senadora Ada Mello ainda destacou alguns pontos do acordo, como o reconhecimento da missão da Igreja na assistência e solidariedade social (art. 5º) e de seu patrimônio histórico e artístico como patrimônio cultural brasileiro (art.6º) e vários outros mais.
.           Gostaria aqui de registrar o fato novo do reconhecimento da personalidade jurídica não só para as dioceses, como até agora, mas também para as paróquias e institutos da vida consagrada  (art. 3º ) . O ensino religioso é reconhecido “em vista da formação integral da pessoa” (art. 11) e  não sei por que restrito ao ensino fundamental (§ único do art. 11). Notável é a garantia oferecida no art. 13 do “segredo do ofício sacerdotal, especialmente o da confissão sacramental”. É ainda de particular importância o disposto no art. 16, que estabelece a inexistência de vínculo empregatício entre ministros ordenados e fiéis consagrados e suas Dioceses ou Institutos religiosos, “a não ser -  esclarece o acordo - que seja provado o desvirtuamento da instituição eclesiástica”  O artigo 17 parece facilitar a concessão do visto permanente para os missionários estrangeiros convidados pelos Bispos para servir nas dioceses brasileiras.
            Enfim, a celebração deste acordo é motivo de comemoração e de júbilo por essa vitória diplomática da Igreja de Jesus em nossa pátria.



quarta-feira, 16 de novembro de 2016

DISTINÇÕES NECESSÁRIAS

            Parece oportuno esclarecer a distinção entre algumas instituições eclesiásticas, distintas, mas muito ligadas entre si e que com frequência são confundidas, principalmente pelos jornalistas.
            A Igreja Católica, na qual subsiste a Igreja de Cristo, como ensinou o Concílio Vaticano II, é constituída pelos fiéis cristãos batizados do mundo inteiro e organizada como sociedade visível, governada pelo Sucessor de Pedro, o Papa, e os bispos em comunhão com ele.
            A Santa Sé, ou Sé Apostólica,  é o órgão supremo de governo da Igreja Católica, que a representa na esfera das relações internacionais e diante dos estados e governos civis. Mantem delegações junto aos governos e órgãos internacionais, os Núncios Apostólicos e recebe embaixadores.
            O Estado da Cidade do Vaticano, ou simplesmente Vaticano, é o território onde se localizava a residência do Papa. Hoje,  com o Papa Francisco, transferida para a Casa Santa Marta, que é um hotel vizinho à Praça de São Pedro. Abrange:  a patriarcal Basílica de São Pedro com sua imensa praça e algumas estruturas e serviços da Santa Sé, como a Poliglota Vaticana, a redação e impressora do L´Osservatore Romano, a paróquia de Santana e outros. Mede menos de um quilômetro quadrado, exatamente 0,44 km ² e é menor que o terreno reservado do Santuário de Aparecida,  em São Paulo.  Foi criado pelo Tratado de Latrão, entre o governo italiano e a Santa Sé, chamados Pactos Lateranenses, em 11 de fevereiro de 1929, como Estado independente. Goza de exclusiva soberania, com o privilégio da extraterritorialidade dentro da cidade de Roma. Tem serviço de correios, confere cidadania, atualmente a cerca de 400 pessoas, incluindo  aí os Cardeais. É sujeito de direito público internacional, sendo representado nas relações internacionais pela Santa Sé, da qual se distingue. Com freqüência, os jornalistas confundem Vaticano com Igreja Católica ou Santa Sé.
            A Cúria Romana é o complexo das instituições presididas pelo Sumo Pontífice que servem à Igreja. É  composta da Secretaria de Estado, congregações ou dicastérios romanos, os conselhos pontifícios, os três supremos tribunais eclesiásticos  (Penitenciaria Apostólica, Signatura Apostólica e Rota Romana) e de outros departamentos, organismos e comissões.
 Há ainda as instituições vinculadas à Santa Sé, como o Arquivo Vaticano, a Biblioteca  Apostólica, os Museus Vaticanos, a Tipografia Poliglota, a Livraria Editora, a Rádio Vaticana e o Centro Televisivo.
Podemos acrescentar aqui a Casa Pontifícia, que, pelo menos até o último pontificado, cuidava das audiências, programadas para receber os bispos nas visitas chamadas “ad limina” e outras audiências a grupos ou personalidades; cuidava ainda das viagens programadas pelo Sumo Pontífice, suas  refeições e seu vestuário.
            Todos esses são serviços e organismos, que podem mudar pelo evoluir dos tempos, as vicissitudes humanas e as contingências históricas. Permanece viva pelos séculos a Igreja de Jesus, santa e pecadora, mas vivificada pela força do Espírito, portadora  da graça e da santidade, que seu Divino Esposo incessantemente lhe comunica para santificação do mundo pelos séculos sem fim.