segunda-feira, 22 de fevereiro de 2016

S. JOÃO PAULO II E A MADAME TYMIENIECKA

                Marco Politi, experimentado vaticanista e Carl Bernstein, jornalista famoso pelo caso Watergate, que culminou com a saída de Richard Nixon da presidência dos EE.UU., escreveram em parceria a melhor biografia, que em vida teve o Papa João Paulo. No alentado volume de quase  600 páginas na tradução portuguesa, os autores dedicam nada menos que 17 páginas ao relacionamento de Tyminiecka e Karol Wojtyla como  padre, bispo e papa.
                Neste artigo, pretendo apenas seguir suas preciosas informações, obtidas em entrevistas dos dois autores com a Madame.
Anna Teresa Tymieniecka nasceu na propriedade  de sua família em Masóvia, na Polônia. Formou-se pela Universidade Jaguielônica de Cracóvia em 1946, sob a  direção do  fenomenólogo Roman Ingarden. Quando o governo comunista começou a apossar-se das propriedades da nobreza polonesa, ela passou a viver em Paris, onde fez mestrado na Sorbonne em 1951 e doutorado em 1952 em Friburgo. Em 1954, Madame Tymieniecka foi para os Estados Unidos, onde ensinou filosofia em Berkeley, na Califórnia, e matemática no Oregon. Fez o pós-doutorado  em Yale e foi professora de filosofia na Pensilvânia.
Em 1972, quando  tinha quarenta e poucos anos, conheceu o livro  A Pessoa Atuante, de Karol Wojtyla. Começou aí um diálogo filosófico com o  autor  que, após quatro anos, resultou, com sua expressiva colaboração, na revisão e edição do livro em  inglês. Esta edição passou a ser a oficial e a Madame  filósofa ficou com os direitos de publicação no mundo inteiro. O cardeal Wojtyla no prefácio da edição inglesa afirma que a Dra. Tymieniecka era responsável pela “maturação do livro” e “sua forma final”. Diz ela do livro de Wotyla: “Uma rápida olhada logo mostrou que essa obra tinha certas afinidades com meu trabalho em fenomenologia. Fiquei espantada,  diz ela, pela ideia de que outro filósofo havia chegado a um ponto de vista tão compatível com o meu. O cardeal respondeu a uma correspondência minha e me concedeu uma audiência em sua residência em Cracóvia. Numa segunda audiência consegui vencer sua relutância em participar de um foro internacional de filósofos, contribuindo com uma monografia.”
Diz ainda a doutora: “Para ter escrito, como escreveu, sobre amor e sexo é preciso saber muito pouco do assunto. Fiquei verdadeiramente estupefata quando li Amor e Responsabilidade (Está traduzido em italiano pela Marietti). A resposta é que ele não teve experiências desse tipo. Ele é inocente sexualmente, mas não em outros campos. Para ser cardeal sob um regime comunista, tinha que ser extremamente astucioso.” E continua ela: “Em Cracóvia nos encontramos algumas vezes para uma excursão, durante a qual seguimos por seis horas, conversando sobre filosofia. Ele era um andarilho entusiasta. Eu mal conseguia segui-lo. Acompanhávamos sempre seu secretário, o Padre Estanislau Dziwiz.”
A  visita do Card. Wojtyla aos Estados Unidos, por ocasião do Congresso Eucarístico Internacional de 1976, realizado em Filadélfia, em comemoração ao bicentenário da Independência americana, foi muito expressiva (Participei desse Congresso e ouvi o Cardeal fazer a homilia em polonês, com um final em inglês).  O  pastor protestante George Williams, professor de Harvard, observador no Concílio Vaticano II e amigo de Tymieniecka convidou o Cardeal para uma palestra em Harvard e a Dra. Tymieniecka apresentou-o à comunidade  daquela Universidade. Essa palestra foi extremamente aceita, inclusive com um artigo no New York Times. Num almoço em Harvard, o marido da doutora, professor Hendryk, um  judeu nascido na Holanda, indicou Wojtyka como o futuro Papa.
A uma indagação sobre atração sexual no seu relacionamento com o Papa, Tymienicka responde: “Vou lhe dizer que não estou interessada em sexualidade. Sou uma senhora polonesa à antiga, que considera que isso não é assunto para conversa nenhuma”.
E concluem os biógrafos de João Paulo II: “Mais tarde, quando ele foi eleito Papa, os repórteres vasculharam o mundo para encontrar alguma mulher, que tivesse sido amante ou companheira de Karol Wojtyla. Não encontraram, porque não existia nenhuma!”

                Essa é a verdade dos fatos. O mais é exploração midiática para atender a interesses escusos...

quarta-feira, 17 de fevereiro de 2016

CAMPANHA DA FRATERNIDADE 2016

                 Mais uma vez a Conferência dos Bispos do Brasil lança, nesta Quaresma, a Campanha da Fraternidade, desta vez também com caráter ecumênico, a quarta que se realiza nesta modalidade – não sei se com muita adesão dos cristãos separados da Igreja Católica – e com apoio internacional da organização de ajuda alemã MISEREOR. Não duvido da aceitação dos pastores e líderes de outras denominações cristãs, sobretudo no  Sul do Brasil, mas não creio muito na aceitação dos fiéis cristãos que se dizem evangélicos, em nosso Nordeste.
                O tema, como  é sabido, é CASA COMUM, NOSSA RESPONSABILIDADE  e o lema, tirado do livro do profeta  Amós, no capítulo 5, diz: “Quero ver o direito brotar como fonte e correr a justiça qual riacho que não seca.”  Diversamente do profeta, o acento aí não está  no direito, mas  sim no “riacho que não seca.”
                Obviamente, a doutrina da Campanha está fortemente ancorada na Encíclica do Papa Francisco Laudato sí,  dedicada, como já anuncia no título, ao cuidado da Casa  Comum. Citando seus predecessores, o Papa refere as sábias palavras do santo e douto Bento XVI: ”O livro da natureza é uno e indivisível, por isso que a degradação da natureza está estreitamente ligada à cultura, que molda a convivência humana.” E cita também o Beato Paulo VI que numa carta apostólica advertia: “Por motivo de uma exploração inconsiderada da natureza, o ser humano começa a correr o risco de destruí-la e de vir a ser, ele também, vítima dessa degradação.”
                O Reitor Mor dos Salesianos, em sua mensagem  de início de Ano para todos os 30 grupos da Família Salesiana, cita o Papa Francisco, que recomendou: “Dom Bosco vos ajude a não frustrar as aspirações profundas dos jovens: o desejo de colaborar  na construção de um mundo mais justo e fraterno, na tutela da natureza e dos ambientes de vida.”
                O objetivo geral da Campanha, como está explicitado no texto oficial, é: “Assegurar o direito ao saneamento básico para todas as pessoas e empenharmo-nos, à luz da fé, por políticas públicas e atitudes responsáveis que garantam a integridade e o futuro de nossa Casa Comum.”
              Na Oração oficial da Campanha, entre outras coisas, pedimos ao “Deus justo e misericordioso”: “Tua Terra, nossa Casa Comum, está em estado deplorável. Que o cuidado para com a nossa Casa Comum nos dê voz forte para denunciar as formas abusivas de exploração econômica. Que o saneamento básico e a água potável limpa se tornem acessíveis a todos os cidadãos.”
                Pensamento bem oportuno é o que recorda  o Arcebispo Primaz,  Dom Murilo Krieger, citando o Presidente John Kennedy: “Não pergunte o que seu país pode fazer por você, mas pergunte a você mesmo o que você pode fazer pelo seu país.” E lembra o provérbio popular: “Se cada  um varrer a frente de sua casa, toda a rua ficará limpa.”

                Fica claro que é do esforço de cada um, da responsabilidade de cada cidadão - além do Governo e da  sociedade organizada - que teremos a preservação ambiental e manteremos limpa nossa Casa  Comum.

sábado, 6 de fevereiro de 2016

Curso para bispos no Rio de Janeiro

“A vocação e  a  missão da Família na Igreja e no mundo contemporâneo” – foi o tema geral do 25º curso anual para os Bispos do Brasil,  promovido pela Arquidiocese do Rio de Janeiro. O Arcebispo Cardeal Dom Orani João Tempesta, O. Cist. esteve à frente dessa bela iniciativa, começada pelo saudoso arcebispo do Rio, Cardeal Dom Eugênio Sales. O Cardeal Orani tem como seu grande auxiliar e organizador – fazendo os convites em Roma e no mundo acadêmico católico – Dom Karl Romer, já bispo auxiliar do Rio.  Participei de todos os vinte e cinco cursos até agora realizados, e este fato simples foi registrado  pelo  órgão da Arquidiocese “Testemunho de fé”, em sua edição de 6 de fevereiro, ao qual muito agradeço a gentileza. Lembro bem que do primeiro curso participou com várias palestras um teólogo alemão, na época,  prefeito da Congregação da Doutrina da Fé, chamado José Ratzinger, depois conhecido mundialmente com outro nome, nosso querido e inesquecível Papa Bento 16.
                Pelos nomes dos oradores, facilmente se pode avaliar o nível das palestras apresentadas e ampla e livremente discutidas pelos bispos participantes: Card. Marc Ouelet,
Prefeito da Congregação romana para os Bispos, que devia abordar os temas: O Matrimônio e a Família na sacramentalidade da Igreja e Entre o Bispo, esposo da Igreja e as famílias que tipo de comunhão existe;  Mons. Juan José Perez Soba, professor no Pontifício Instituto para a Família João Paulo II, tratou de dois importantes assuntos: Grandes temas teológicos e antropológicos ligados ao matrimônio e A fé que guia e vivifica a família;  Mons. José Granado Garcia, também com dois temas importantíssimos e muito atuais:  A corporalidade do homem e da mulher  e a imagem de Deus e A corporalidade na linguagem do amor, na encarnação de Jesus, no pecado e na redenção;  Dom  João Carlos Perini, bispo de Camaçari, na Bahia, apresentou o seu tema: A  família no debate cultural e político contemporâneo e leu também, com alguns comentários e respostas às indagações dos bispos participantes,  os dois temas do Cardeal Ouellet que, por motivo de saúde e compromissos na Cúria romana, não pôde afastar-se  de Roma naqueles dias e enviou por escrito seus temas; o Padre Jesus Hortal, jesuíta, já reitor do Instituto de Direito Canônico do Rio, explicou-nos com muita competência e clareza a nova sistemática canônica para julgar da validade dos matrimônios, promulgada pelo Papa Francisco no documento “Mitis Iudex Dominus Jesus”  ( O Senhor Jesus, manso Juiz).
                Éramos 97 bispos, de todos os recantos do país. Na oportunidade, que me foi oferecida,  presidindo a Hora de Vésperas do Ofício Divino, à tarde, afirmei, sem medo de errar, que mais de 90% dos matrimônios de famílias ricas, celebrados em nossas igrejas, no centro das grandes cidades, não têm nada do divino Sacramento do Matrimônio e, portanto, não trazem a marca canônica da indissolubilidade. As preocupações são: o vestido da noiva, os convidados da alta sociedade em trajes da moda, muitas vezes, impróprios para um ato religioso, os cerimoniários e seguranças, a música - às vezes, com grande orquestra e  inadequada para um ato litúrgico - a iluminação especial, com caminhonetes de fornecimento de energia elétrica suplementar. Nada de confissão, nada de preparação espiritual, nada da Eucaristia. São os que eu chamo de “shows matrimoniais”.

                Evidentemente, tais matrimônios não têm nada de indissolúvel...

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

"Enquanto durar..."

O matrimônio é um pacto de amor e de vida. Para sempre... Com boa dose de cinismo, alguns afirmam que o amor é eterno enquanto durar...  Já um professor de Direito Canônico em São Paulo nos advertia, seminaristas estudantes de Direito, com uma ponta de ironia: ”Vejam bem: alguns matrimônios são válidos (?)”. Se são válidos esses “alguns”, de que falava o canonista, não podem ser dissolvidos.
                É bom lembrar aqui mais uma vez que a Igreja não anula nenhum matrimônio válido, mas os tribunais eclesiásticos declaram que aquele matrimônio foi nulo desde o primeiro instante. Os tribunais eclesiásticos devem definir às partes solicitantes se seu casamento foi válido e se o foi, não pode ser anulado.
                O matrimônio natural entre não-cristãos ou entre um cristão e um não-cristão tem a sua dignidade e está por si orientado para a indissolubilidade, mesmo que não seja sacramento. Ele pode ser dissolvido para o bem da fé do cônjuge cristão, que sofra do cônjuge não-cristão, o que se chama no direito de “privilégio paulino” porque concedido por São Paulo (1 Cor 7, 12-16).
                O que surge agora é gravíssima questão, suscitada nada menos do que pelo teólogo Joseph Ratzinger. Fique bem claro que não é o caso de um pronunciamento do Magistério Supremo da Igreja, que exige a adesão de nossa fé cristã. L´Osservatore Romano publicou longo artigo em mais de duas páginas, observando que se tratava de trecho de obra pouco conhecida do cardeal Ratzinger, publicada em 1998.
                Num encontro com o clero da diocese de Aosta (Itália), em 25 de juho de 2005, poucos meses depois de sua eleição, o Papa tratou da questão do matrimônio como sacramento de fé e afirmou: “É particularmente dolorosa  a situação de quantos tinham casado na Igreja, mas não eram verdadeiramente crentes e só o fizeram pela tradição, um costume familiar (eu acrescentaria “por exigência social”), e depois  se separaram, contraindo um segundo casamento não-válido diante da Igreja, converteram-se, encontraram a fé e agora sentem-se excluídos dos Sacramentos. Este é realmente um grande sofrimento, e quando era Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, convidei várias Conferências episcopais e especialistas para estudarem este problema: pode haver um sacramento celebrado sem fé? E se realmente é possível encontrar nesse fato uma instância de nulidade, porque ao sacramento faltou uma dimensão essencial que é a fé, não ouso dizer (humildade e sinceridade de nosso grande Papa teólogo). Eu pessoalmente pensava assim, mas nos debates que tivemos compreendi que o problema é muito difícil e ainda deve ser aprofundado.”
                Em resumo, o teólogo Ratzinger quer dizer nesse texto que o sacramento exige a fé; se não há fé, não é sacramento. O silogismo é simples: se não é sacramento, não possui indissolubilidade.
                Nesses dois últimos anos, nos vários casamentos que presenciei na Basílica do Coração de Jesus no Recife, não aparecia nada de fé mas simples cerimônia pomposa, com muita luz, muita música, muitos trajes da última moda (e do ultimo decote) mas nada de oração, de devoção e de fé.

                Seriam eles sacramentos de fé, portanto válidos, portanto indissolúveis? Ou simples cerimônias sociais e portanto  dissolúveis? Respondam os canonistas...

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2016

O maior dos Sacramentos

Sem dúvida, o maior dos Sacramentos é a Eucaristia. Ela é a forma divina que Jesus encontrou para atender ao pedido que lhe fizeram os dois discípulos de Emaús: “Fica conosco, Senhor!” Ele já havia dito aos seus seguidores: “Trabalhai pelo alimento que o Filho do Homem vos dará porque Deus, o Pai, o marcou com um selo. É meu Pai        quem vos dará o verdadeiro pão do céu, porque o pão de Deus é o pão que desce do céu e dá vida ao mundo. Eu sou o pão da vida.  Eu sou o pão vivo descido do céu. Quem comer deste pão terá a vida eterna.” E finalmente, mais incisivo ainda: ”O pão que eu darei é minha carne para a vida do mundo”. Leia isso, que Jesus disse em Cafarnaum, no evangelho de São João, capítulo 6º, do versículo 27 ao 51.
“Tendo amado os seus que estavam no mundo, amou-os até o último extremo do amor”, diz João, o discípulo amado. Aconteceu isso na noite da traição, antes da agonia no horto, antes de sua prisão, de sua paixão dolorosa e de sua morte ignominiosa. Foi na última Ceia pascal que o Senhor Jesus celebrou com seus apóstolos, após ter lavado os pés de seus discípulos, tomou o pão, elevou os olhos ao céu e disse as solenes palavras, cumprimento do que prometera em Cafarnaum: TOMAI E COMEI, ISTO É O MEU CORPO. (Veja os evangelhos de Marcos, 14, 22, Mateus, 26, 26 e segs e Lucas 22,19 e 20, e ainda São Paulo na 1ª Carta aos Coríntios, 11, 23 a 27).
A Eucaristia é o grande mistério de nossa fé. É S. Tomás de Aquino, eminente teólogo, que nos ensina num hino eucarístico: “Na cruz estava escondida só a divindade. Aqui está escondida também a humanidade. Creio em ambas e confesso a minha fé.”
Mistério de fé, de pura fé, é também mistério de amor. De sumo e infinito amor. Já o discípulo amado, João, o apóstolo predileto de Jesus, como vimos acima, fala da Eucaristia como o extremo gesto de amor de Jesus por nós, no momento  em que o ódio contra Ele mais se acirra e chega ao paroxismo da traição.
Meu amigo leitor, para comungar, para receber o Corpo do Senhor na Eucaristia, você precisa ter fé na presença real de Jesus na hóstia consagrada. Além disso, é preciso estar com a consciência tranquila, isto é, que sua consciência não o acuse de nenhuma falta grave. Se isso não acontece ou se faz mais de um ano que você se confessou, então você precisa antes de comungar receber o perdão de Deus, mediante a confissão individual, isto é, recebendo o sacramento da Penitência que o reconcilia com o Pai.  Mas não vá entender, amigo leitor, que cada vez que você vai comungar, precisa confessar-se como alguns pensam. Não, repito: Você só precisa confessar-se se tiver pecado grava na consciência ou se faz mais de um ano que se confessou.
Lembro aqui uma coisa: todo católico, depois de feita a Primeira Comunhão, deve receber a Sagrada Eucaristia ao menos uma vez cada ano, no tempo pascal, ou por justa causa, em qualquer outro tempo do ano. É prescrição do cânon 920 do Código de Direito Canônico.
Ainda uma palavra final: Os cristãos que vivem maritalmente, sem terem recebido o sacramento do matrimônio, infelizmente não podem receber a Eucaristia. Ensina S. João Paulo II : “Seu estado de vida contradiz objetivamente aquela união de amor entre Cristo e a igreja, significada e atuada exatamente na Eucaristia.” Esses cristãos que vivem essa situação irregular e desejam de coração receber Jesus na Eucaristia, devem fazer a comunhão espiritual, que é o desejo sincero e ardente de receber o Corpo de Cristo. Esse desejo expresso numa oração íntima e pessoal lhes dará graças abundantes. É o que fazem os cristãos da Pastoral da Segunda União, criada em Maceió por Frei Paulo Amâncio de Freitas, capuchinho, e que tem dado tantos frutos espirituais.

O maior sacramento é o sacramento do amor de Jesus, que se faz pão para nosso alimento espiritual.  

Ideologia de gênero

De uns tempos para cá, começou-se a falar em “ideologia de gênero”. Mas o que é isso, afinal? Que importância tem em nosso cotidiano?  Que repercussão essa tal ideologia terá, se aplicada,  na formação de nossa juventude? E afinal, que efeitos esse conceito poderia trazer, se transformado em lei, como pretendem seus fautores mais avançados, para nossa sociedade, que se pretende cristâ?
                  É simples e estarrecedor ao mesmo tempo.  A tal ideologia de gênero, por incrível que pareça, pretende afirmar que a distinção entre os sexos deve ser uma mera escolha de cada um, independentemente de seu aparelho genital,  de sua psicologia específica, de seus gostos e aptidões, que distinguem e sempre distinguirão o homem da mulher e vice-versa.
                Assim, a criança desde seus verdes anos, iria escolher se quer ser menino ou menina, homem ou mulher, sem nada influirem nesta escolha seus órgãos genitais, suas naturais tendências e inclinações. Ninguém nasce homem ou mulher, dizem eles, mas ao longo da vida, vai escolher sua própria identidade. Gênero  -dizem  – é uma construção pessoal, auto-definida e ninguém deve se identificar como homem ou mulher, mas terá que inventar, definir sua própria identidade. Em consequência disso, se ensina que a família é uma instituição antiquada.  Os tempos mudaram – afirmam – e precisamos “abrir a cabeça”.
                O perigo que se corre atualmente é que essa tal “ideologia de gênero” possa ser por força de lei ensinada nas escolas públicas. Desde o ano de 2012, mais de quinze projetos de lei            foram apresentados no  Congresso Nacional, tentando aprovar esta aberração nas escolas públicas do Brasil. Assim, nossas crianças  iriam aprender que elas não nascem meninos ou meninas, mas devem livremente optar por um gênero para si mesmas. Em 2014 – informa o jornal da Arquidiocese do Rio – o Congresso Nacional retirou do Plano Nacional de Educação, em 25 de julho daquele ano, todas as menções da tal “ideologia de gênero”. Este Plano foi aprovado pela Presidente da República com a lei 13.005. No entanto, o Fórum Nacional de Educação, desconsiderando a autoridade do Congresso Nacional publicou, em novembro de 2014, um texto a ser apresentado aos Estados e municípios da Federação, contendo os mesmos termos rejeitados no Congresso Nacional. O texto inclui mais de trinta vezes as equívocas expressões “identidade de gênero” e “orientação sexual”.

                Com o pretexto de combater a discriminação da mulher e dos homossexuais, os fautores da tal “ideologia de gênero” o que desejam  mesmo é desconstruir  a instituição familiar, modificando o conceito cristão de pai e mãe, de filho e filha, do casamento, do sentido religioso da família e de tudo o que compõe seus reais valores. Assim, pretendem destruir o edifício da família no sentido cristão, desconstruindo as idéias religiosas sobre sexo, família e sociedade.

O Sacramento da grande viagem

Diz Marcos em  seu evangelho, cap. 6, vers.12 s :”Partindo (os Doze) pregavam que todos se convertessem. E expulsavam muitos demônios, e curavam muitos enfermos ungindo-os com o óleo”. Esse texto insinua, é prelúdio ou esboço carismático, do sacramento da Unção dos Enfermos – diz o teólogo Pe. Penido.  O mesmo referem Mateus, 10,8 e Lucas 9,1: Os apóstolos recebem de Jesus o poder de curar os enfermos e o realizam com a unção do óleo.
                Em meu livrinho “Direitos e Deveres dos Cristãos” escrevi: “O dever dos fiéis cristãos, relativamente à Unção dos Enfermos, é que os parentes dos doentes em estado grave cuidem diligentemente que eles sejam confortados com esse sacramento, em tempo oportuno, possivelmente ainda com o uso da razão, para que possam também confessar-se. ‘Com o uso da razão’ significa que o enfermo esteja ainda na posse de suas faculdades mentais e possa conhecer os sacramentos que recebe. Esse é o ideal, que infelizmente nem sempre acontece em virtude do medo, pouco cristão, de que o doente vá assustar-se com a presença pastoral e benévola do sacerdote. O fiel tem esse dever grave para com seus entes queridos, pais, filhos, cônjuge e outros, e não deve ter o receio pagão de que vai amedrontá-lo com a recepção dos santos sacramentos da Igreja: Confissão, Comunhão e a Santa Unção.”
                E continuo: “Todo fiel, que tenho atingido o uso da razão começa a estar em perigo de vida, por motivo de saúde ou de idade, deve receber este sacramento da Unção dos Enfermos. O sacramento pode ser repetido se, depois da convalescença, recair em outra doença grave ou se, durante a mesma doença, houver novo perigo de vida. E pode receber este sacramento o doente inconsciente que, enquanto estava no uso da razão, ao menos implicitamente, como bom cristão, tornou  manifesto o desejo de receber esse sacramento, quando oportuno.”
                E ainda: “Não pode receber o sacramento dos enfermos o doente que, no uso da razão, permanece obstinadamente em pecado grave manifesto e recusa-se terminantemente a receber o sinal do perdão de Deus. Não é o caso – acrescento e é muito importante – de quem viveu maritalmente com um segundo cônjuge, sem o sacramento do matrimônio e o padre saberá convidá-lo a um sincero arrependimento desse erro, com as outras faltas de sua vida passada.” Esse, é claro, pode e deve receber juntamente com o perdão do sacramento da Penitência, a Unção dos enfermos e a Sagrada Comunhão, contanto que ele se disponha a, caso recobre a saúde, resolver sua situação irregular e não voltar a uma vida conjugal errada.
                Ensina ainda o Catecismo da Igreja Católica em  seu número 1524: “A Penitência, a Sagrada Unção e a Eucaristia, recebida como viático, constituem, quando a vida cristã chega ao seu termo,  os  sacramentos que preparam para a Pátria, ou os sacramentos que consumam a peregrinação.” Já o Concílio de Trento ensinara que a Unção dos Enfermos (chamada na época Extrema Unção) é o sacramento dos que partem. E a partida não é o fim, é um começo. Diz o prefácio da missa dos defuntos: “Para os que crêem em vós, Senhor, a vida não é tirada, mas transformada.”
                A Mãe do teólogo Padre Penido disse para o filho na hora da morte, com um suave e sereno sorriso: “Confessei-me, comunguei, recebi a Unção dos Enfermos, estou prontinha para o céu.”

                Êsse é o Sacramento da grande viagem...



O Sacramento do serviço

Ser leitor, acólito, diácono, padre ou bispo são  funções variadas de serviço ao povo de    Deus na Igreja.
                Leitor e acólito – são os chamados ministérios: a serviço da Palavra de Deus ou a serviço da Santa Missa.
O Diácono é o servidor por excelência, desde o nome, que significa exatamente “servidor” em grego, até sua instituição pelos Apóstolos no Livro dos Atos, capítulo 6. É a primeira instituição na sagrada hierarquia. Criados inicialmente para “servir às mesas”                              (Atos 6,2), logo se destacaram pela pregação da Palavra, notadamente  Filipe e Estêvão. Este último, o primeiro mártir do testemunho cristão.  Infelizmente, por séculos na Igreja, o diaconato reduziu-se a uma mera etapa no acesso ao presbiterato. Hoje, graças ao Concílio Vaticano II, temos a riqueza da restauração do Diaconato  permanente. São vários seus serviços na Igreja: presidir à Celebração da Palavra na ausência do presbítero, distribuir a Santa Comunhão, levar o  Santíssimo Sacramento aos doentes, participar dos conselhos pastorais da paróquia e muitos outros relevantes serviços, exercidos na Igreja sempre com o apoio do presbítero e a aprovação do Bispo diocesano.
O presbítero – palavra que significa  ancião – é o segundo grau do Sacramento da Ordem. Ensina-nos S. Pedro: “Aos presbíteros (anciãos) que estão entre vós, exorto eu, presbítero como eles e testemunha dos sofrimentos de Cristo.” (1 Pedro, 5,1). Na antiga liturgia, na missa de S. Pio V, o sacerdote celebrante dizia  aos pés do altar, antes de começar o Santo Sacrifício: “Entrarei ao altar de Deus, o Deus que alegra a minha juventude” (Sl 42). Assim, o Padre no serviço ao Povo de Deus é de todas as idades. No oração consecratória,  pede  o Bispo ordenante para os novos presbíteros: “Pai todo-poderoso, constituí estes vossos servos na dignidade de presbíteros; renovai em seus corações o espírito de santidade; obtenham o segundo grau da Ordem sacerdotal e sua vida seja exemplo para todos.”
   Dom Bosco, em Florença, no gabinete do chefe do governo italiano, ministro Picasoli, antes de sentar-se para a audiência a que fora convocado, advertiu: “Lembre-se V. Excia que Dom Bosco é Padre no altar e no confessionário, e como é Padre em Turim também é Padre em Florença, Padre em meio aos seus jovens, Padre na casa do pobre como no palácio do Rei e dos ministros – Padre sempre e acima de tudo, Padre!” E o Santo de Turim  aconselhava aos padres: “ Sacerdote, celebre a tua Missa sempre – como se fosse a primeira – como se fosse a última – como se fosse a única.”
                Como o Povo de Deus deve venerar e amar os seus Padres, servidores da comunidade eclesial e ministros dos sacramentos da santificação!  Como deve rezar por eles todos os dias: “Dai-nos, Senhor, os Padres de que a Igreja precisa!”
                A plenitude do Sacramento da Ordem em seu grau mais elevado está no episcopado.
              O Bispo ordenante, entre outras coisas, pergunta ao Eleito: “Queres, com teus colaboradores, presbíteros e diáconos, cuidar do povo de Deus com amor de Pai e dirigi-lo no caminho da salvação?” E ainda: “Queres, por amor a Deus, mostrar-te afável e misericordioso para com os pobres?” Ao que, o Bispo eleito responde: “Quero.”
                A palavra grega epíscopos  significa “olhar do alto”,  “ser vigia”. Mas o Bispo, na verdade, é  Pai e Pastor. A cruz peitoral, que usa o Papa Francisco  não apresenta, como de costume, Jesus crucificado, mas o Bom Pastor com as mãos cruzadas ao peito, com as ovelhinhas que o cercam. O Bispo de Roma quer indicar, com esse símbolo diário e constante,
o que seus irmãos, bispos do mundo inteiro, devem ser pelo supremo grau do Sacramento da Ordem: Pais e Pastores. 
 Seus Padres e seu povo são  sua verdadeira riqueza e felicidade.






O primeiro sacramento

                Numa feliz iniciativa do Sr. Arcebispo Metropolitano, Dom Antônio Muniz, a Arquidiocese de Maceió programou  para os próximos anos rever e atualizar todas as conquistas pastorais, obtidas em seu 1º Sínodo Arquidiocesano, realizado de 1988 a 1991. A Assembléia Arquidiocesana de Pastoral,  realizada nos dias 19 e 20 de novembro último, começou o estudo do Sacramento do Batismo à luz do 1º Sínodo, que continuará durante todo o próximo ano de 2015, revendo e atualizando as normas estabelecidas no evento sinodal.
                O Batismo é o primeiro sacramento da Igreja, que nos dá a graça primeira, faz-nos filhos adotivos de Deus, regenerados em Cristo Jesus, membros vivos da Igreja, com um caráter indelével.  O cânon 867, § 1, do Código de Direito Canônico, preceitua que “os pais têm obrigação de cuidar que as crianças sejam batizadas dentro das primeiras semanas; logo depois do nascimento, ou mesmo antes, dirijam-se ao pároco a fim de pedir o sacramento para o filho e ser devidamente preparados para ele.” E acrescenta no §  2:” Se  a criança estiver em perigo de morte, seja batizada sem demora.”
                Além de providenciar o batismo de seus filhos o mais cedo possível, os pais devem fazer a preparação exigida pela diocese, para poderem assumir dignamente diante de Deus o compromisso de educá-los na fé, conforme prometem durante  o rito do batismo. E se não o podem educar devidamente, providenciem, com maior cuidado ainda, padrinhos devidamente preparados para exercerem essa gravíssima missão, em sua ausência ou impossiblidade. O filho não pode ser privado do sacramento pelo erro do pai e, sobretudo, da mãe, no caso da prostituta, ou de qualquer modo afastados da prática religiosa.
                Pai e mãe não se escolhe, padrinho e madrinha sim. Diante de Deus e de sua Igreja, no sagrado rito litúrgico do batismo, eles se comprometem a educar na religião o afilhado. Por isso, deverão ser pessoas de verdadeira vida cristã, que possam substituir os pais que, por culpa deles ou sem culpa, não podem dar aos filhos a necessária educação religiosa, quando chegar a idade apropriada.  Padrinho não é pessoa rica e influente na sociedade, mas sim  verdadeiro avalista diante da Igreja da educação religiosa do afilhado, no caso da omissão ou impossibilidade dos pais.
                Há ainda a considerar o batismo de emergência. Se uma criança, antes do uso da razão, estiver em grave perigo de vida, com autorização de ao menos um de seus pais, seja batizada por qualquer pessoa, usando a fórmula e o rito da Igreja. Para isso, essa pessoa (que também pode ser um dos próprios pais) deve ter a intenção  de “fazer o que faz a Igreja” quando administra este sacramento;  deve derramar água natural na cabeça da criança, pronunciando a fórmula sacramental: “Fulano (dá um nome à criança), eu te batizo em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo”. E se a criança sobreviver àquele perigo de vida, seja levada à paróquia para os ritos complementares, esclarecendo ao pároco que ela já foi batizada “em perigo de vida”.

                É  bom  lembrar aqui finalmente que em nossa Primeira Comunhão,  na Crisma e todos os anos na celebração da Vigília Pascal, renovamos nossos compromissos batismais, com a plena e viva adesão de nossa fé, renunciando ao pecado e a todo mal, de maneira adulta, consciente e responsável.

Mártir da maternidade

                Apesar de já tê-la apresentado em  meu último artigo CASAIS DE SANTOS,  a figura extraordinária e tão oportuna para  nosso tempo de Santa Gianna Beretta, merece destaque especial. É  o que pretendo fazer agora.
                “Extremamente límpida, extremamente graciosa” definiu-a o noivo, engenheiro Pedro Molla. Na Universidade, fôra uma jovem amável, mas decidida e reservada. Todos os dias,  participava da Santa Missa e comungava; rezava diariamente o terço e fazia meia-hora de meditação. Em 1949, formou-se em medicina e se especializou em pediatria em 1952.  “Quem toca o corpo de um paciente, toca o corpo de Cristo” – assim entendeu o exercício da medicina.
                “Caríssimo Pedro” – escreveu ela ao noivo em sua primeira carta. ”Quero realmente te fazer feliz e ser aquela que tu desejas, boa, compreensiva e pronta para os sacrifícios que a vida exigirá de nós.” Preparou-se espiritualmente para receber o Sacramento do Amor com um tríduo de orações,  Santa Missa e comunhão, que propôs ao futuro marido, que o acolheu com todo  entusiasmo. Uniram-se em matrimônio em 24 de setembro de 1955 em Magenta,  Itália. Os dois vivem uma robusta tradição religiosa familiar com profunda vida eucarística, sabiamente inserida na modernidade. Gianna ama o esporte, particularmente o esqui, a música, o teatro. Leva o marido, sempre ocupado como importante chefe industrial, aos concertos de música clássica. Dá vida ao núcleo local da  Ação Católica com promoções várias. Considera esta atividade parte de sua missão de médica. O marido lerá após sua morte os apontamentos com que preparava as reuniões, onde encontrou “uma conexão indissolúvel entre o amor e o sacrifício”.
                Vêm os filhos: Pedro Luiz, Maria Rita e Laura. Na quarta gravidez, eis a inquietadora descoberta: um fibroma no útero. Aqui é necessário esclarecer: Conforme a moral católica,  é lícito realizar uma operação, tendo por finalidade direta extirpar um tumor no útero, mesmo com o risco de indiretamente provocar a morte do feto. Mas Gianna tem sua escala de valores, que coloca em primeiro lugar o direito à vida. Uma cirurgia talvez  a fizesse renunciar àquela maternidade para não  morrer, para não deixar o marido viúvo e os três primeiros filhos órfãos. “Disse-me explicitamente – lembra  o marido Pedro Molla – com tom firme e ao mesmo tempo sereno, com um olhar profundo que nunca esquecerei:  Se é para escolher entre mim e a criança, que está para nascer, nenhuma hesitação: escolha a vida da criança. Eu o exijo! Salve-a.”
                Pedro que conhecia bem a generosidade de Gianna, seu espírito de sacrifício, a força de suas escolhas e decisões,  sentiu-se na obrigação de consciência de respeitá-la.” A opção de Gianna só se pode entender à luz de sua fé, de sua firma convicção  do direito sagrado da vida, do heroísmo de seu amor materno e de sua plena confiança na Providência Divina” – diz o Pe. Ferdinando Colombo  na revista Sacro Cuore de Bolonha.
                E assim, a 21 de abril de 1962, nasce Gianna Emmanuela, perfeita e sadia. Sua mãe a tem nos braços, antes de morrer heroina sete dias depois. Tinha 39 anos.

                S. João Paulo II a declara beata em 24 de abril de 1994. O mesmo Papa santo  a canoniza em 16 de maio de 2004 como verdadeira mártir da maternidade...

Casais de Santos

A canonização pelo Papa Francisco dos pais de  S. Teresinha, Luiz e Zélia Martin, no domingo, 18 de outubro último, em plena realização do Sínodo dos Bispos sobre a Família, constitui-se num  veemente apelo à santidade matrimonial  e numa chamada de atenção a toda a Igreja para a santidade  do  Sacramento do amor, vivido cada dia e cada hora no ambiente familiar.
                Em sintonia com essa realidade, vou apresentar aqui, neste curto espaço, alguns  exemplos de casais, que viveram em  profundidade a  santidade da vida matrimonial.
                Começo naturalmente pelos pais de Santa Teresinha.  Ambos desejaram consagrar-se inteiramente ao Senhor na vida religiosa. Luís, nascido em Bordeaux  (França) em 1823,  tentou entrar no Mosteiro São Bernardo do Monte,  mas não foi  aceito porque “não sabia latim...” Zélia, nascida em 1831, também esteve um tempo  no Mosteiro da Visitação, mas a Superiora achou que ela não era p ara a  vida religiosa. Encontraram-se em Alençon, ele joalheiro e ela, fabricante da famosa renda de Alençon, onde os dois se casaram  em 1858 e tiveram nove filhos, dos quais quatro morreram na primeira infância e cinco se consagraram a Deus na vida religiosa. Deles, S. Teresinha, que tinha quatro anos quando perdeu a mãe, disse: ” O Bom Deus me deu pais, mais dignos do céu do que da terra.” Na verdade, a vida dos dois foi de muito amor, dedicação total às  filhas, profunda vida espiritual de união com Deus. Declarou certa vez Zélia Martin: “Quero ser santa. Mas  não será nada fácil porque há  muita coisa para se  queimar e a madeira é dura  como uma pedra”. Pais santos dignos de uma filha santa, como S. Teresinha.
                “Eu te amo tanto, tanto,  Pedro, que tu me estás sempre presente, desde a Santa Missa da manhã, quando no Ofertório eu ofereço juntamente com o meu, o teu trabalho,  tuas  alegrias e tristezas; e assim durante todo o dia até o anoitecer” – dizia Gianna Beretta ao noivo Pietro Molla. Filha de pais de profunda fé cristã, teve sete irmãos,  uma pianista, dois :engenheiros, três médicos e uma farmacêutica. O engenheiro ordenou-se sacerdote e veio como missionário para o Maranhão;  dos  médicos também dois se tornaram missionários, uma freira e um padre. Ela  se formou em medicina em 1949 e se especializou em pediatria em 1952. Pedro e Gianna casaram-se em 1955 em Magenta,  na Itália. Gianna teve três filhos: um rapaz e duas meninas.
 Na quarta gravidez,  descobriu-se um fibroma no útero. Aí a  opção: tratar o fibroma com o  risco indireto da morte do feto, para não deixar o jovem marido viúvo e três pequenos órfãos ou não fazer tratamento algum  para garantir a vida do feto? Para  Gianna era clara a opção:  em primeiro lugar, o direito de nascer. Ela diz a Pedro com voz firme e ao mesmo  tempo serena: “Nenhuma hesitação;  escolho e exijo: salvem a criança e não se importem comigo!” Gianna Emanuela nasceu no dia 21 de abril de 1962 e a mãe ainda  a  teve nos braços antes  de morrer  em 28 de abril. Adulta, Emmanuela pôde dizer: “Minha Mãe foi duas vezes minha mãe:  uma quando me gerou,  outra quando deu a vida para que eu nascesse.”
                Outro casal que desejo apresentar aqui é  o do conhecido filósofo francês Jacques Maritain e sua esposa,  também filósofa, a russa RaÏssa Oumançoff.  Ele, de família protestante, nascido em 1882, ela de origem hebraica, judia de  religião, nascida em 1883. Conhecem-se na Sorbonne e casam-se em 1904. Sua casa em   Meudon torna-se ponto de encontro de filósofos, teólogos, escritores, poetas e artistas.  Jacques, um dos animadores da resistência francesa ao invasor nazista,  vai morar nos Estados Unidos de 1940 a 1944. De  ´44 a ´48 Jacques reside em Roma como embaixador da França junto à  Santa Sé. Raïssa falece em 1960 e Maritain participa como observador do Concílio Vaticano II, convidado pelo Papa Paulo VI.
                Raïssa teve papel insubstituível e primário no caminho de Jacques para Cristo.  Sempre em busca da verdade, ele lê um romance de Leon Bloy, seu grande amigo católico, que lhe abre o caminho à conversão. Em 11 de junho de 1905 os dois recebem  o Batismo e Bloy registra o fato: “Este dia equivale à eternidade.” O estudo de S. Tomás de Aquino para Raïssa foi sua segunda conversão. “Tudo ali, diz ela, é pureza da fé,  integridade do intelecto, iluminado pela ciência e pelo gênio.” E testemunha:” O sacramento do matrimônio transforma o  amor romântico num verdadeiro e próprio amor humano, real e indestrutível, um amor verdadeiramente  desinteressado, que não exclui o sexo, mas torna-o sempre mais independente dele: uma completa e irrevogável doação de um para o outro, por amor do outro”. E numa de suas poesias ela canta: “O Deus dos corações/ cancela dos anos a poeira/ e te leva sem rugas nem manchas,/ do amor ao Amor sem ocaso!”                        
                Além dessa última canonização do Papa Francisco, já em 21  de outubro de 2001, São João Paulo II beatificara o casal  Luiz Beltrame  e Maria Corsini. 

Foi  a primeira na história da Igreja para nos mostrar como o matrimônio cristão é santo e faz santos... 

Política e Religião

"Na história, os ordenamentos jurídicos foram quase sempre motivados religiosamente. Com base em uma referência à Divindade, decidia-se aquilo que era justo entre os homens. Ao contrário das outras grandes religiões, o cristianismo nunca impôs ao Estado e  à sociedade um direito revelado, nunca impôs um ordenamento jurídico, derivado da Revelação  divina. Apelou para a natureza e a razão como verdadeiras fontes do direito; apelou para a harmonia entre razão objetiva e subjetiva, mas uma harmonia que pressupõe que suas esferas sejam fundadas na razão, criatura de Deus " - foi o que disse     o Papa emérito Bento 16 num famoso discurso, em 22 de setembro de 2011, no Parlamento de Berlim.
            Doutrina igual ele já havia exposto em outra semelhante oportunidade no dia 17 de setembro de 2010, no Westminster Hall, em Londres: " A tradição católica afirma que as normas objetivas que governam o reto agir são acessíveis à razão, prescindindo do conteúdo da Revelação. Em vista disso, o papel da religião no debate político não consiste tanto em oferecer tais normas, como se elas não pudessem ser conhecidas pelos não-crentes. Muito menos propor soluções políticas concretas - o que está totalmente fora da competência da religião."
              As duas referências acima foram citadas pelo arcebispo Georg Ganswein, prefeito da Casa Pontificia e secretário particular do papa emérito. É ele quem acrescenta às observações do Papa teólogo que, numa democracia digna deste nome, é inaceitável dar espaço ao discurso religioso como tal, porque estaria baseado numa autoridade, que frustraria qualquer tentativa de diálogo com os outros. E mais: "Ao intervir no diálogo democrático com base nos dogmas, as religiões violariam a regra de ouro das democracias - o diálogo entre as diversas posições - e agiriam como obstáculos, alterando a dinâmica democrática."
                 "O cristianismo que  Bento 16 propõe não permite, disse Ganswein numa Universidade romana, em junho passado, que os fiéis na ação política se privem do uso da razão, escondendo-se por detrás de um princípio de autoridade divina ou entrincheirando-se atrás de regras religiosas. As funções últimas do direito devem ser procuradas na razão e na natureza."  Bento 16 afirma, conclui seu secretário, que a fonte das normas jurídicas não é a Revelação mas a razão e a natureza das suas inter-relações,
               Na Idade Média, sobretudo no Sacro Império Romano-Germânico houve a confusão entre fé e política, entre governo e religião. A própria Reforma Protestante - pseudo reforma - consagrou o princípio "cuius régio, huius et religio"  - a região segue a religião do Rei.
                 No regime imperial brasileiro, tivemos o catolicismo como religião oficial do Estado e a lei do padroado, pela qual o Imperador indicava e mantinha bispos e párocos.
Consequência foi a falta de autêntica evangelização de nosso povo e nossos bispos mártires Dom Vital e Dom Macedo Costa.
                 Concluindo, quero deixar claro que o católico na política vive com destemor os princípios católicos de sua consciência, sobretudo os relativos à vida, à família, e à santidade do matrimônio, mas não usa a Igreja nem sua fé católica no debate democrático.

                       

Os vários Natais

O Natal de 2015  afigura-se-nos  duvidoso e angustiado. Os ataques terroristas de Paris na sexta-feira, 13 de novembro, deixaram  o mundo perplexo e atemorizado. Em nossa pátria, a situação política e econômica, com  as maiores personalidades da República envolvidas em processos criminais e a economia cada dia mais angustiante,  deixa-nos inquietos e temerosos, neste final de ano, para celebrarmos a festa do Natal.
                Apesar de tudo isso, nossas capitais se apresentam  ricamente engalanadas para a festa do Natal. Por exemplo, a capital do Rio Grande   do Norte, que leva exatamente  o nome significativo de Natal, está  com suas lindas avenidas feericamente  iluminadas, com  uma belíssima Árvore de Natal na principal delas.
              Mas, é diversa a celebração do Natal, conforme o compromisso cristão e a sensibilidade religiosa de cada um.
                Há o Natal do consumo, que é o Natal dos presentes, dos shoppings centers lotados, das ruas comerciais apinhadas de pedestres apressados, dos comerciantes calculando os lucros, em comparação com outras datas do calendário festivo. É o Natal dos cartões sem referência ao Divino Aniversariante. É o Natal do Papai Noel, o velho barbudo de origem episcopal,  que vem das regiões gélidas do planeta.
                Há o Natal da gastronômica ceia natalina, o Natal do peru cevado e dos vinhos importados, reunindo parentes,  provindos de outras cidades para a Ceia da meia-noite.
                Há o Natal histórico, comemorando o fato acontecido pelos anos 6/5 antes da era cristã, relatado pelo evangelista Lucas, no qual uma Virgem chamada Maria, desposada com um carpinteiro de nome José, deu à luz virginalmente a uma Criança, que envolveu em paninhos e reclinou numa manjedoura em uma gruta nos arredores de Belém de Judá  porque, apesar de serem descendentes do rei Davi, não haviam encontrado lugar para eles na cidade, durante o recenseamento  ordenado pelo imperador romano César Augusto. Os pastores que vigiavam seus rebanhos nos arredores de Belém  (portanto, não era inverno nem era dezembro...) foram notificados por anjos do céu  do fato extraordinário do nascimento do Messias esperado e convidados a ir adorar o recém-nascido na gruta, sempre segundo o evangelista Lucas. E a fé cristã nos diz que este Menino de Belém é o próprio Filho de Deus feito homem para nossa salvação.
                Há, finalmente, baseado nessa revelação bíblica, o Natal da missa do galo,  com a celebração  da divina Eucaristia naquela noite santa, preparada com a recepção do santo sacramento da Confissão, para uma piedosa Comunhão e participação digna e frutuosa do Sacrifício eucarístico.
                Este é o Natal da Igreja. Este deve ser o nosso Natal, sem desprezar os outros Natais, mas evitando os exageros e colocando o Natal do Papai Noel, da Árvore, dos presentes, dos cartões e da ceia natalina em dependência da celebração litúrgica da Noite santa  do nascimento do Filho de Deus,  feito homem por nosso amor.




Jovens natalenses

Um belo grupo de mais de trinta ex-alunos do Salesiano, com seus cônjuges, reuniram-se no sábado, 28 de novembro passado, no vetusto casarão do Colégio São José, para numa festiva e bem  fraterna celebração recordarem, neste aniversário de quarenta anos , os tempos felizes passados nos bancos escolares do mais antigo Colégio Salesiano de Natal.
                Fui convidado como seu diretor e criador do chamado então “curso científico”,  hoje ensino do nível médio. Aquela turma foi também a primeira mista,  grande novidade na época, quando as primeiras meninas entraram no corpo discente do “São José”.
                A programação começou com a Santa  Missa, por mim celebrada na capela do colégio, seguida de um almoço numa casa de refeições da cidade, continuado com música e dança. O programa ainda se estendeu para a  noite da segunda-feira, 30, com jantar em casa de tradição nordestina.
                A primorosa organização, liderada pela ex-aluna Maria Auxiliadora Pereira Pinto, tinha três  objetivos:
               Recordar os anos da juventude passados naquele colégio, para render graças a Deus por todos os benefícios ali recebidos, lembrando que recordar é viver; 
              Dar infinitas graças ao nosso bom Deus que nos presenteou com a vida, a  família, a  educação,  recebida naquela casa de ensino e formação cristã, as oportunidades que o Senhor nos  ofereceu na vida, lembrando que tudo é dom, tudo é graça;
                Alimentar  sadio e proveitoso companheirismo naquele grupo de amigos, que viveram tantos momentos juntos, passaram tantas horas de alegria, de estudos e de lutas para vencerem na vida, sempre amparados pela proteção  de Maria Auxiliadora e de Dom Bosco, conforme as lições  de seus mestres salesianos.
                Cada um seguiu o seu caminho, um é engenheiro, outro médico, outro professor, outro em tantas outras profissões.    
                Meus votos de velho mestre e mui querido diretor de todos, é que cubram de bênçãos e os protejam  na caminhada  da vida o Senhor, nosso Deus e a Virgem Santa Auxiliadora, cujo nome ali aprenderam a venerar e amar, no método educativo de Dom  Bosco, que sempre queria formar “bons cristãos e honestos cidadãos.”


Entrevista estranha

Estranha a entrevista que, em lugar privilegiado, concedeu a importante revista de circulação nacional Sua Eminência Reverendíssima o Sr. Cardeal Dom João Braz de Aviz, Prefeito (igual a presidente) da Congregação para os Institutos da Vida Consagrada e as Sociedades de Vida Apostólica da Cúria romana.
                Estranhas as comparações que Sua Eminência faz entre o Papa Francisco e o santo e sábio papa emérito Bento 16. “A principal diferença – diz ele - está na forma de se comunicar. Vejo o Papa Francisco pelo menos a cada duas semanas. O relacionamento com ele é direto. Se preciso falar com o Papa, marco uma audiência.” Realmente não entendi... Estranho que seja ele quem marca a audiência e não o Papa. Pelo menos a cada duas semanas?... E continua: “Raramente o encontro demora mais de uma semana para acontecer. Quanto a Bento 16, na última vez que pedi para falar com ele, o encontro foi marcado para dali a quatro meses. Ele é  extremamente tímido, e essa timidez causou uma dificuldade de comunicação muito grande. Os documentos que enviávamos a ele passavam antes por diversas instâncias. Muitas vezes já chegavam ao papa com interpretações que não eram as nossas.” Diz ainda o purpurado: “O Papa Francisco tem o hábito de mandar bilhetes, sem intermediários. Tenho uns onze guardados. Todos estão em espanhol: Querido hermano,  a ver si usted me puede ayudar.”
                Há ainda outra coisa estranha nessa entrevista cardinalícia. E é o que se refere aos dois conclaves, de que participou Sua Eminência. Trata-se da reunião para a eleição do Papa, a que tomam parte exclusivamente os cardeais, com menos de 80 anos.  Na atual disciplina da Igreja, ele é realizado sob absoluto sigilo. Após as reuniões preparatórias, em que são discutidos os principais problemas da Igreja naquele momento, para encaminhar a escolha de um Papa para aquela época, o prelado que encaminha os trabalhos faz a curiosa proclamação em latim: Extra omnes – “Todos para fora!” A Guarda Suiça fecha a Capela Sistina por fora, ficando no recinto apenas os cardeais eleitores e o pessoal de serviço. Daí veio o nome “conclave”, isto é, ”com chave”.
Estranho que o ex-arcebispo de Brasília tenha feito revelações sobre os dois conclaves de que participou. Do primeiro, diz que teve muito medo de ser eleito Papa (?). E acrescentou que o Cardeal Martini, arcebispo de Milão, vendo que podia ser eleito, mostrou as mãos trêmulas e explicou: “Vejam, estou com Parkinson e piorando. Vocês não podem votar em mim. Votem em Bergoglio.” “A partir de então, o nome de Ratzinger ganhou força. Foi Bento 16. Do segundo conclave,  que elegeu Papa Francisco, diz o Card. Aviz claramente: “Votei nele porque era um homem autêntico e simples.” Mas confessou que tinha uma pontinha de medo, porque – diz expressamente – “Ele é jesuíta...”

Espero que seu anunciado livro – “Eu João” –  seja menos estranho...

Leigos a serviço das vocações

Na década de 1930, surgiu entre os católicos americanos um movimento de leigos, imitando um pouco em sua metodologia de trabalho o Lions Club e que por isso mesmo tomou inicialmente o nome de Serra Clube. “Leigos a serviço das vocações” – era seu lema e objetivo de sua ação.  O nome do patrono é homenagem ao Frei Junípero Serra, grande apóstolo franciscano espanhol, que por mais de trinta anos foi  missionário no México e na então chamada Nova Espanha, hoje Califórnia. Aí começou o Serra Clube com suas reuniões mensais, realizadas durante uma refeição, à imitação do Lions e  de outros movimentos semelhantes. Frei Junípero foi beatificado pelo Papa S. João Paulo II no dia 25 de setembro de 1988 e agora canonizado pelo Papa Francisco, quando de sua visita a Washington em 23 de setembro deste ano.
O Serra Clube, hoje denominado Movimento Serra, formado de leigos, homens e mulheres, tem por finalidade rezar e trabalhar pelas vocações  sacerdotais e religiosas  na Igreja. È urgência absoluta na pastoral da Igreja o desenvolvimento e cultivo das vocações de especial serviço eclesial, como são os sacerdotes e os religiosos, consagrados ao serviço de Deus, ao anúncio do Evangelho, com a palavra e o exemplo.
 Seus objetivos são:  favorecer e promover vocações  ao serviço ministerial na Igreja e apoiar os sacerdotes em  seu sagrado ministério; valorizar e animar entre os leigos a vida religiosa consagrada; ajudar seus membros a reconhecer e responder com sua própria vida a dignidade de cristãos em meio ao mundo.
                O Movimento  Vocacional Serra chegou ao Brasil  na segunda metade do século passado, trazido pelo Arcebispo do Rio de Janeiro, Cardeal Dom Jaime Câmara, que encontrou na pessoa do primeiro presidente brasileiro, Luiz Alexandre Compagnoni,  grande líder e devotado apóstolo das vocações sacerdotais e religiosas. Com zelo e competência, o Compagnoni fundou o Serra nas principais capitais brasileiras e inúmeras outras cidades. Hoje o Movimento Serra tem um conselho nacional, com sede em Curitiba-Paraná e  se  encontra em plena expansão em mais de duzentos centros espalhados em todo o Brasil.
                Estive esta semana em Aracaju e pude admirar a vitalidade e a ação do Movimento Serra, ali  fundado em  1977, quando era Arcebispo Dom Luciano José Cabral Duarte e eu era seu bispo auxiliar. A atuação do Movimento Vocacional  Serra Clube se faz sentir no despertar das vocações sacerdotais e no cuidado com o Seminário Arquidiocesano.   
                Que São Junípero Serra abençoe os esforços e trabalhos dos sócios sergipanos do Movimento, que leva seu nome,  para sempre maior vitalidade da presença da Igreja no mundo.


O homem que me ensinou a ser bispo

O homem que me ensinou a ser bispo foi Dom Luciano José Cabral Duarte, figura exponencial do episcopado brasileiro nos anos 1970 a 2005. O  ser Arcebispo Metropolitano de sua terra natal, Aracaju, é caso mais único que raro na história dos Bispos do Brasil. Quando padre, doutorou-se em filosofia pela Sorbonne de Paris, com  brilhante tese  escrita em francês que, infelizmente,  só recentemente, após sua doença, foi publicada por sua irmã Carminha Duarte, com a tradução portuguesa. Grande Arcebispo, foi notável no campo da educação,  como membro do Conselho Federal de  Educação e presidente do MEB (Movimento de Educação de Base),  criado pela Igreja do Brasil no combate ao analfabetismo, nos difíceis tempos do regime militar. Empenhou-se com todas as veras e conseguiu, após muita luta com o Ministro da Educação, Jarbas Passarinho, a criação da Universidade Federal de Sergipe que, infelizmente, nunca soube reconhecer e ser-lhe devidamente grata por esse seu esforço decisivo para a educação em Sergipe.
                O seu clero estava bem unido e solidário com sua ação pastoral. Alguns, de outras nacionalidades, que o combateram antes de sua promoção de bispo auxiliar  para  Arcebispo, retiraram-se quando ele assumiu o governo  pastoral pleno de Aracaju. Cada ano tinha a grande alegria de promover pessoalmente a tradicional romaria a Divina Pastora, cuja igreja matriz era o santuário mariano da Arquidiocese. Na sua esclarecida ação social, criou a PROHCASE (Promoção do Homem do Campo de Sergipe),  com terras de cinco fazendas, compradas ou recebidas em doação e nas quais número expressivo de agricultores trabalhavam para seu honesto sustento, mediante pequena contribuição para  a Arquidiocese. Depois da experiência de alguns anos, as terras destas fazendas foram doadas aos que as cultivavam. Foi autêntica e sábia reforma agrária, tão apregoada e mal realizada pela esquerda brasileira.
                Dom Luciano exerceu como poucos o ministério da Palavra. Suas homilias aos domingos, na igreja de São Gonçalo,  transmitidas pela Rádio Cultura, eram autênticas lições de sábia teologia pastoral. O mesmo se pode dizer de seus programas na mesma rádio da Arquidiocese ao meio-dia dos domingos, seguidos por imenso  número de ouvintes em todo o  Sergipe.
                Fui nomeado seu bispo auxiliar  pelo Beato Paulo VI, que me elegeu bispo titular de Zallata,  cidade antiga da Algéria.  Foi Dom Luciano quem me sagrou bispo em Natal, em 20 de abril de 1975. Trabalhei ao seu lado por cinco anos e foi ele com sua experiência quem me reintroduziu na pastoral. Eu vinha do trabalho na educação, como diretor de escola, membro do Conselho Estadual da Educação e presidente da Associação de Educação Católica e do Sindicato dos Estabelecimentos de Ensino do Rio Grande do Norte.   
                Muito aprendi de sua  inquebrantável fidelidade ao Papa, sua irrestrita adesão ao ensinamento da Igreja de Jesus, sua  decidida defesa do ensinamento pontifício, nos  tempos difíceis, em que ele viveu e exerceu seu ministério. Tempos difíceis na política nacional e tumultuados dentro da Igreja, com posições  teológicas equivocadas.
                Enfim, foi Dom Luciano Duarte o homem que me ensinou a ser bispo...


Uma Igreja inquieta

Com grande repercussão na imprensa italiana – favorável aos católicos ou não – o Papa Francisco fez confidências notáveis de sua visão de Igreja  aos bispos e delegados de todas as dioceses da Itália, participantes do Quinto Congresso da Igreja Italiana, em 10 de novembro do ano passado, na belíssima catedral da cidade da arte, Florença.
                Pretendo nesse artigo limitar-me a citações da palavra do Sumo Pontífice, sem comentários.
                “Sonho com uma Igreja livre, aberta, inquieta, cada vez mais próxima dos abandonados, com o rosto de uma mãe que compreende, acompanha e acaricia” afirmou Francisco. Contemplando a cúpula da belíssima catedral da cidade da arte, disse ele: “Nesta cúpula,  está representado o Juízo Universal. No centro está Jesus, a nossa luz. A inscrição,  que se lê no ápice do afresco, é: Ecce Homo – ´Eis o Homem´. Olhando para esta cúpula somos atraídos para o alto, enquanto contemplamos a transformação do Cristo, julgado por Pilatos, ao Cristo elevado ao trono de Juiz.” Citando o evangelista João, diz o papa: “Deus não enviou o seu Filho ao mundo para condenar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por ele.” (Jo 3, 17). E continua: “À luz deste juiz de misericórdia, os nossos joelhos dobram-se em adoração e  nossas mãos e pés fortalecem-se. Só podemos falar de humanismo a partir da centralidade de Jesus, descobrindo nele os traços do autêntico rosto do homem.”  Mais adiante continua o Pontífice: “Humildade, abnegação, bem-aventurança: as três características que desejo apresentar hoje à vossa meditação sobre o humanismo cristão, que nasce da humanidade do Filho de Deus. E essas características dizem algo também à Igreja italiana, que hoje se reúne aqui para caminhar unida num exemplo de sinodalidade.”
                Com vigor, acentuou o Papa citando S. João Paulo II: “A opção pelos pobres é forma especial de primado na prática da caridade, testemunhada por toda a tradição da Igreja” (Encíclica Sollicitudo rei socialis, 42). E citando o seu antecessor: “Esta opção está implícita na fé cristológica naquele Deus, que se fez pobre por nós a fim de nos enriquecer, mediante a sua pobreza.” (Bento XVI na  Conferência de Aparecida). Continuou Francisco: “Que  Deus proteja a Igreja italiana contra qualquer tipo de poder, de imagem, de dinheiro. A pobreza evangélica é criativa, acolhe, apoia e é rica de esperança.” Ainda:” Aprecio uma Igreja italiana inquieta, cada vez mais próxima dos abandonados, dos esquecidos, dos imperfeitos. Desejo uma Igreja feliz com um rosto de mãe, que compreende,  acompanha, acaricia. Sonhai também vós com esta Igreja, acreditai nela, inovai com liberdade. O humanismo cristão que sois chamados a viver afirma radicalmente a dignidade de cada pessoa como filho de Deus, estabelece entre todos os seres humanos uma fraternidade fundamental, ensina a compreender o trabalho, a habitar a criação como casa comum, fornece razões para a alegria e o bom humor mesmo numa  vida muitas vezes dura. Apesar de não competir a mim dizer como realizar hoje este sonho, permiti-me só que vos deixe uma indicação: Para  os próximos anos em cada comunidade, paróquia e instituição, cada diocese e circunscrição, em cada região, procurai dar início de forma sinodal  (o papa  quer dizer de forma comunitária) a um aprofundamento da Evangelii Gaudium  (sua exortação apostólica) a fim de haurir dela alguns critérios práticos e atuar suas indicações, especialmente sobre as três ou quatro prioridades que ireis indicar neste congresso.”
                E concluindo: “ Confio-vos a Maria, que aqui em Florença  é venerada como Santíssima

Annunziata. No afresco que se encontra na homônica Basílica – onde irei daqui a pouco – o Anjo cala e Maria fala, dizendo: Eis aqui a escrava do Senhor – faça-se em mim segundo as tuas palavras. Nessas palavras estamos todos nós. Que toda a Igreja italiana as pronuncie com Maria.